Alex Castro - o início da minha segunda onda literária


Amanda e eu nos conhecemos na boate. Não dentro: na porta.
Eu pastoreava uma matilha de amigos, todos pavlovianamente vestidinhos no melhor es- tilo da estação, e só eu de roupas coloridas. Amanda nos relanceou um olhar e sentenciou: todos entram, menos o aloha. Camisa florida aqui, nunca. 


Quando eu era criança, minha mãe não me deixava ver filmes até tarde na TV. Os filmes de segunda feira na Globo, por exemplo, eu nunca podia assistir. E assim como eu era obrigado a não ver os filmes, ela "pedia" para meu pai gravar os filmes para nós, seus filhos (eu e meus irmãos). Imagino que meu pai não reclamava, era um alvará dado pela fonte interessada, para ficar até tarde vendo TV, e ele ainda aproveitava para atuar como censura prévia. Quando as coisas ficavam muito violentas, ele pausava a gravação, esperava o corte do comercial e soltava o REC novamente.

Mesmo assim, isso nunca me impediu de criar heróis na minha infância, como fazem todas as crianças. As vitórias do Rambo, ainda mais incríveis com a direção de arte do meu pai, me impressionaram ainda mais de tal forma, que com 10, 11 anos, eu só comia pizza como o Rambo, pegando os pedaços de pizza com a mão, como ele fazia na série animada. Ainda na mesma infância, eu sonhava ser astronauta. A culpa era da revista Super Interessante, que na minha época falava mesmo de ciências e coisas interessantes. Ela vinha com um ônibus espacial para recortar e montar, que foi meu brinquedo favorito da minha infância (e durou o tanto que um brinquedo de papel pode durar na mão de uma criança).

Na adolescência, mesmo com minha revolta e rebeldia infantil, eu queria ser meu pai. De certa forma, quero até hoje. A segurança e tranquilidade que ele transmitia à mim me inspiraram a pisar em suas pegadas. Fiz a escola técnica em mecânica, fiz a FATEC e busquei trabalho na área. O trabalho que me conduziu até a Paulista, onde somei uma paixão infantil com acesso à livrarias e escritores e criei um novo sonho, ser escritor. Esta fase teve altos e baixos, cada vez que minhas contas apertavam, eu volta à focar no trabalho, nos estudos e afastava os sonhos literários como quem espanta uma mosca incômoda, como quem põe a cabeça para fora do carro, numa noite fria, tentando espantar o sono. Até encontrar o Alex Castro.

Eram 2005 e eu buscava reaquecer minha escrita, decido a manter um jornal em PDF e distribuir por email a interessados ou a quem não reclamasse. Depois de um tempo eu tinha 60 "assinantes". Não sei quantos liam de fato, mas eu sei que para manter o jornal andando, eu voltei à ler mais do que nunca. E nas leituras e navegações virtuais cheguei a um blog de nome longo na época, Liberal Libertário Libertino e me deslumbrei com os textos.

Em 2001, no auge da minha veia artística eu bradava aos quatro ventos que eu adepto da subliteratura underground e subversiva, só pela paixão das palavras, estranhas a uma maioria de pessoas, e dúbia ao ser tão, mas tão underground, quera subliteratura underground. Pelo título do blog em 2005, todos aqueles sentimentos voltaram à tona.

Aviso
Esse é um livro de ficção. Tudo aqui é falso. Inclusive esse aviso.
(...) Na verdade, se você gostar dos textos, não faz diferença qual é a verdade. E, se não gostar, menos ainda.

Fascinado pelo texto do autor, A Porta, que você pode ler aqui, um conto intenso, que mergulha o leitor de tal forma, que quando vemos estamos lá, vivendo aquelas aventuras, rindo daqueles momentos ridículos, e sofrendo aquelas angústias. Todo o livro "Onde perdemos tudo"é assim. Uma mentira contada três vezes vira verdade. Os textos do Alex viram verdades na primeira leitura. É tal a forma que seus contos foram escritos, que eu passei a acreditar que existe um autor chamado Jácome Gol.

Nos livros e nos contos conheci o escritor, mas foi no blog e nos textos de Alex Castro, que encontrei um intelectual, na melhor acepção possível da palavra (aparentemente NERD virou elogio e intelectual virou ofensa, vai entender...). Cheguei ao seu blog na época, ou logo após, ele concluir uma série que ele pleiteia levar ao prelo, chamada: As Prisões. Uma série de textos questionadores, inquisitivos, provocativos, que nos tiram do conforto do lugar comum. Nos irritam, nos fazem pensar neles e então, quando nos damos conta, estamos nos questionando também as prisões de nossas vidas.

Alex Castro não nos faz questionar nossa rotina com a arrogância de quem acha que tem as respostas certas, apenas com o orgulho de ter se feito, primeiro, estas mesmas questões. Ele não oferece respostas, como Morpheus de Matrix, ele só pode te mostrar a porta. Seguir por estas trilhas é uma missão sua. O Alex Castro pessoa/ficção também me fizeram me apaixonar pela missão deste ser: filho de uma família que teve dinheiro, empresário que se arrebentou na bolha das empresas ponto com, ele teve sabedoria para diminuir, e focar naquilo que ele gostava de fazer. Passou a dar aulas de inglês, cruzando a cidade à pé, enquanto buscava se erguer naquilo que ambicionou desde jovem: escrever, ler, ensinar, aprender.

A realidade destas mudanças, a família, a empresa, dos carros importados ao ônibus sem ar condicionado, poderia tornar as pessoas amargas, ao Alex serviram para deixá-lo mais sensível, mais focado. Expôs um nervo, mas era um nervo bom, como neste texto do Alex:

O que você gosta de ouvir?, me perguntou meu amigo
Eu: Mulher rindo. Alho refogando. Zíper abrindo. Ondas quebrando. Gemidos de gozo. Criança brincando. Dois sapatos caindo no chão, um depois do outro. O apito do sorveteiro que passava pela minha casa. Passos descalços no chão frio. “Eu te amo, Alexandre.” O Oliver latindo quando chego em casa. Saltos altos no mármore. Máquina de escrever elétrica. Pisada forte de mulher decidida. Apito do recreio. Pernas femininas, vestidas de couro ou látex, roçando uma contra a outra enquanto andam. Suspiro saciado de prazer. O telefone me acordando de manhã.
Ele: Não. Eu quis dizer de música.
Eu: Ah. 

Ao final, na fase que cheguei ao LLL, era fase que ele viajava para Nova Orleans. Após ter batido em várias portas para tratar de um tema de mestrado, e não ter conseguido o apoio de nenhuma instituição brasileira, através de um mestre destas universidades ele chegou a uma, nos Estados Unidos, que estava disposta a bancar ao Alex, com casa, comida e uma biblioteca indecorosa de grande, em troca de Alex ministrar aulas. E a faculdade ainda pagaria ao Alex trinta dias em Cuba! Para fins da pesquisa, claro, mas que também rendeu outros frutos, como o livro Radical, Rebelde, Revolucionário (sério, como ele pensa estes títulos?).

Nem isto, de ir para os Estados Unidos com uma bolsa foi fácil. Os problemas o perseguiram na forma do furacão Katrina, que o fez evacuar da cidade, separar-se de seu cachorro de estimação e cruzar os Estados Unidos atrás de abrigo. E desta dor, nasceu uma extensão ao seu livro, de mesmo nome do seu blog, o LLL.

Hoje, Alex Castro vive no Rio de Janeiro, concluiu o trabalho que se desafiou a fazer nos Estados Unidos, e busca viver de escrever, numa terra que ninguém parece se dedicar à ler, mas ele não desanima, não perde a sua poesia no escrever, e nem deixa de nos questionar com suas perguntas ousadas, por vezes, nos fazem nos desorientar e questionar as nossas próprias decisões que tomamos até aqui. Sem mencionar que o Alex é também um podólatra, e que surpresa descobrir que o cara que admiro comparte, assim publicamente, algo que também sou... É, eu sou!

Eu, por exemplo, espero um dia ser um Alex Castro. Não igual, ele é unico, mas adotar dele um exemplo de dedicação às artes e aos prazeres da vida. Não que um dia eu vá chegar lá, tão pouco fui astronauta ou fui o rambo, mas é um norte... É um norte...

Saiba mais e leia-o em: http://www.alexcastro.com.br

Para ler minha resenha sobre Radical Rebelde Revolucionário, clique aqui: http://lec.blogspot.com.br/2012/02/resenha-radical-rebelde-e.html

Comentários

flavio de jesus disse…
Muito bom
parabens para o autor
irei visitar o seu site mais vezes,vou compartilha com uns amigos que também se interessam por este assunto.

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