Ruídos e silêncios...
Hoje completam sete semanas que minha esposa e eu fomos para a Argentina. Eu voltei quatro dias depois com meu DNI debaixo do braço. Ela ficou. Ela só volta em mais uma semana, afazeres da faculdade dela que coincidiram com um ano sem feriados no Brasil. Um ano sem feriados no Brasil quer dizer que o semestre letivo começa mais tarde, e ela que é professora, tem férias mais longas. Até depois do carnaval. E não antes.
Dezembro, já sem minha esposa, eu posso dizer sem culpa que passou sem me dar conta que estava sozinho. Solteiro ou com alvará, como dizem os malandros. As festas de fim de ano, a correria para comprar presentes, os almoços de confraternização, tudo isso fez com que dezembro passasse sem eu perceber. Somente em janeiro, uma nova rotina começou a se estabelecer nomeu nosso apartamento.
Depois que chego do trabalho, ouço o Top10 da Mtv e vejo o SPTV. Me banho, preparo qualquer coisa para eu jantar, que irá servir de almoço no dia seguinte, lá no serviço. Janto vendo o Jornal Nacional e desligo a TV e todas as luzes da casa, tão logo o jornal termina. Fico eu e o laptop até meia noite, uma hora. Escrevo, leio, vejo vídeos e agendo posts para o blog. Meu desafio auto imposto é de 365 textos, um por dia, mas eu me precavejo à dias que eu não poderei escrever, e mantenho uma semana à frente de textos prontos. Alguns textos para datas festivas, conforme ocorrem, eu também já escrevo. Até 2014 já tem texto escrito.
Com o silêncio da casa, além das teclas reclamando a cada toque, começo a aprender também os ruídos do prédio. Isso quando os ruídos das construções permitem, há três delas só na mesma quadra em que vivo, e que vão das seis da manhã às dez da noite, às vezes mais. Uma vizinha que toma banho às 7 da noite. Cantando. Outra que recebe amigos da faculdade, tornando seu apartamento uma mini república e enchendo o meu, de fumaça. Outra deve ser professora de dança holandesa, pois parece passar as noites dançando de tamancos de madeira acima do meu apartamento. Cães e gatos também fazem parte da orquestra.
Silêncio no meu prédio só de sábados e domingos à noite. Aí parece que todos ou saíram para as baladas, ou estão dormindo. As construções param nas noites de sábado e de domingo também. E foi esse silêncio que me apresentou a um ruído novo.
Estava lavando louça no último domingo, onze horas da noite mais ou menos e a casa toda escura, menos a cozinha. Quando ouvi um ruído seco de alguém tentando abrir uma porta que pensava estar destrancada, mas não estava. Era minha porta. Meu coração gelou de susto e pé ante pé fui ver pelo olho mágico. Por alguma razão, minha porta tem dois olhos mágicos. Um permite ver até o final do corredor, o outro permite ver bem, quem está perto. A luz do corredor acesa mas ninguém no corredor. Teria imagino? A corrente do trinco da porta chacoalha levemente. Teria sido o vento? Balanço a cabeça para tentar esclarecer as coisas. A luz do corredor acesa e o trinco balançando. Alguém errou de andar e se mandou quando se deu conta. Claro.
Eu mesmo já errei de andar algumas vezes. Destas vezes que o dia do escritório emenda com uma palestra em faculdade à noite, e eu chego em casa mastigado. O elevador pára no andar errado, atendendo a algum chamado esquecido e eu, sem me dar conta, só fui perceber porque minha chave não funcionava quando o dono do apartamento abre a porta e diz: "Pois não?". Por sorte ele me conhecia e rimos da situação. E eu corri pelas escadas para meu apartamento...
Já tinha esquecido disso tudo, quando segunda, estou fazendo o almoço de terça e lavando louça quando ouço, de novo, o baque na minha porta. Coração gelado e eu verifico se meu transtorno obsessivo compulsivo estava em ordem: trinco na porta, ok; chaves na fechadura trancada, ok; sapatos na frente da porta, ok. Deixo a chave com meio giro à mais, pois assim é impossível alguém abrir a porta por fora. A chave não entra por fora se a de dentro está com meio giro à mais. E meus sapatos, eu aprendi outro dia que servem de freio para a porta. Desci de chinelos para a padaria sem me dar conta que os sapatos estavam mal estacionados e quando voltei, levei uma portada na cara. Eu tiro os sapatos assim que chego em casa. Assim não trago a sujeira da rua para o apartamento.
Mas tinha aquele ruído na porta. Corro para o olho mágico. Corredor apagado. Trinco sem balançar. E então a louça na pia cai, pela água que deixei aberta, quase me fazendo enfartar. Devo estar ficando louco. Me viro para ir à cozinha no exato instante que a porta é forçada de novo. Alguém tentando entrar. O coração tenta escapar por minha boca. Fico congelado no mesmo gesto, sem respirar, tateando com a audição algum ruído de fora. Nada. Nenhuma luz entrando no apartamento pela fresta debaixo da porta. Merda. É só minha imaginação, repito para mim mesmo, como se fosse o personagem de Poe em O Corvo. Ou é em algum vizinho.
A semana se passou, e apesar de eu me lembrar de trancar, BEM, a porta, nenhum susto novo ocorreu. Pensava que eu escutava algum apartamento acima ou abaixo batendo a porta, alguma forma de eco bizarro, mas pelo sim, pelo não, tranco minha porta.
Eu estava dormindo quando o barulho na porta que me acordou. Levantei num pulo, ou melhor, desmoronei ao lado da minha cama. A porta rangeu seu abertura preguiçosa. Alguém entrou no meu apartamento. Acendo a luz? Não, vou caminhando pé ante pé, alcanço a porta do quarto. A porta da sala está aberta. A casa escura. Olho para o banheiro. Porta fechada. Só há a cozinha e a sala. ambos requerem que eu saia do quarto. Medo. Largatixo pela parede e estico o pescoço para a sala. Há alguém ali, em pé, olhando pela janela. De costas para mim, no meio da minha sala aberta, de forma surreal, olhando pela janela. Meu Mac, minha mãe e meu celular me vêem à mente. Fico congelado. Não sei o que fazer e não faço nada, sentindo minha respiração me denunciar a qualquer instante. Até acordar no dia seguinte ainda assustado.
De agora em diante durmo com a TV ligada.
Dezembro, já sem minha esposa, eu posso dizer sem culpa que passou sem me dar conta que estava sozinho. Solteiro ou com alvará, como dizem os malandros. As festas de fim de ano, a correria para comprar presentes, os almoços de confraternização, tudo isso fez com que dezembro passasse sem eu perceber. Somente em janeiro, uma nova rotina começou a se estabelecer no
Depois que chego do trabalho, ouço o Top10 da Mtv e vejo o SPTV. Me banho, preparo qualquer coisa para eu jantar, que irá servir de almoço no dia seguinte, lá no serviço. Janto vendo o Jornal Nacional e desligo a TV e todas as luzes da casa, tão logo o jornal termina. Fico eu e o laptop até meia noite, uma hora. Escrevo, leio, vejo vídeos e agendo posts para o blog. Meu desafio auto imposto é de 365 textos, um por dia, mas eu me precavejo à dias que eu não poderei escrever, e mantenho uma semana à frente de textos prontos. Alguns textos para datas festivas, conforme ocorrem, eu também já escrevo. Até 2014 já tem texto escrito.
Com o silêncio da casa, além das teclas reclamando a cada toque, começo a aprender também os ruídos do prédio. Isso quando os ruídos das construções permitem, há três delas só na mesma quadra em que vivo, e que vão das seis da manhã às dez da noite, às vezes mais. Uma vizinha que toma banho às 7 da noite. Cantando. Outra que recebe amigos da faculdade, tornando seu apartamento uma mini república e enchendo o meu, de fumaça. Outra deve ser professora de dança holandesa, pois parece passar as noites dançando de tamancos de madeira acima do meu apartamento. Cães e gatos também fazem parte da orquestra.
Silêncio no meu prédio só de sábados e domingos à noite. Aí parece que todos ou saíram para as baladas, ou estão dormindo. As construções param nas noites de sábado e de domingo também. E foi esse silêncio que me apresentou a um ruído novo.
Estava lavando louça no último domingo, onze horas da noite mais ou menos e a casa toda escura, menos a cozinha. Quando ouvi um ruído seco de alguém tentando abrir uma porta que pensava estar destrancada, mas não estava. Era minha porta. Meu coração gelou de susto e pé ante pé fui ver pelo olho mágico. Por alguma razão, minha porta tem dois olhos mágicos. Um permite ver até o final do corredor, o outro permite ver bem, quem está perto. A luz do corredor acesa mas ninguém no corredor. Teria imagino? A corrente do trinco da porta chacoalha levemente. Teria sido o vento? Balanço a cabeça para tentar esclarecer as coisas. A luz do corredor acesa e o trinco balançando. Alguém errou de andar e se mandou quando se deu conta. Claro.
Eu mesmo já errei de andar algumas vezes. Destas vezes que o dia do escritório emenda com uma palestra em faculdade à noite, e eu chego em casa mastigado. O elevador pára no andar errado, atendendo a algum chamado esquecido e eu, sem me dar conta, só fui perceber porque minha chave não funcionava quando o dono do apartamento abre a porta e diz: "Pois não?". Por sorte ele me conhecia e rimos da situação. E eu corri pelas escadas para meu apartamento...
Já tinha esquecido disso tudo, quando segunda, estou fazendo o almoço de terça e lavando louça quando ouço, de novo, o baque na minha porta. Coração gelado e eu verifico se meu transtorno obsessivo compulsivo estava em ordem: trinco na porta, ok; chaves na fechadura trancada, ok; sapatos na frente da porta, ok. Deixo a chave com meio giro à mais, pois assim é impossível alguém abrir a porta por fora. A chave não entra por fora se a de dentro está com meio giro à mais. E meus sapatos, eu aprendi outro dia que servem de freio para a porta. Desci de chinelos para a padaria sem me dar conta que os sapatos estavam mal estacionados e quando voltei, levei uma portada na cara. Eu tiro os sapatos assim que chego em casa. Assim não trago a sujeira da rua para o apartamento.
Mas tinha aquele ruído na porta. Corro para o olho mágico. Corredor apagado. Trinco sem balançar. E então a louça na pia cai, pela água que deixei aberta, quase me fazendo enfartar. Devo estar ficando louco. Me viro para ir à cozinha no exato instante que a porta é forçada de novo. Alguém tentando entrar. O coração tenta escapar por minha boca. Fico congelado no mesmo gesto, sem respirar, tateando com a audição algum ruído de fora. Nada. Nenhuma luz entrando no apartamento pela fresta debaixo da porta. Merda. É só minha imaginação, repito para mim mesmo, como se fosse o personagem de Poe em O Corvo. Ou é em algum vizinho.
A semana se passou, e apesar de eu me lembrar de trancar, BEM, a porta, nenhum susto novo ocorreu. Pensava que eu escutava algum apartamento acima ou abaixo batendo a porta, alguma forma de eco bizarro, mas pelo sim, pelo não, tranco minha porta.
Eu estava dormindo quando o barulho na porta que me acordou. Levantei num pulo, ou melhor, desmoronei ao lado da minha cama. A porta rangeu seu abertura preguiçosa. Alguém entrou no meu apartamento. Acendo a luz? Não, vou caminhando pé ante pé, alcanço a porta do quarto. A porta da sala está aberta. A casa escura. Olho para o banheiro. Porta fechada. Só há a cozinha e a sala. ambos requerem que eu saia do quarto. Medo. Largatixo pela parede e estico o pescoço para a sala. Há alguém ali, em pé, olhando pela janela. De costas para mim, no meio da minha sala aberta, de forma surreal, olhando pela janela. Meu Mac, minha mãe e meu celular me vêem à mente. Fico congelado. Não sei o que fazer e não faço nada, sentindo minha respiração me denunciar a qualquer instante. Até acordar no dia seguinte ainda assustado.
De agora em diante durmo com a TV ligada.
Comentários
Sua esposa precisa voltar com urgência! Ficar sozinho em casa está te deixando maluco! rs