Crônica: Quinquilharias
A praça Benedito Calixto em São Paulo é famosa pela feira de antiguidades e quinquilharias que realiza semanalmente. A própria palavra quinquilharias deve ser uma das palavras que ela comercializa. Desde a invasão do estrangeirismo em nossa língua pátria, pouco depois do fim da ditadura militar e abertura de fronteiras, Gadgets é a palavra da moda, seja qual for a pronúncia correta disto.
Benedito Calixto foi famoso artista plástico, nascido em Itanhaém em 1853 e morreu pouco depois da semana de arte moderna de 1922, mais precisamente, em 1927 e seu nome não poderia ter homenagem mais justa que esta feira, maravilhosa para se perder sábado à dentro, bem como nas ruas do entorno da praça.
Quando passeio pela feira, não posso deixar de imaginar ao ver por lá espalhados objetos antigos, que outrora foram sonhos de consumo de nossos pais e avos, o que verão nestas feiras meus filhos e netos. Todos os objetos hoje lá expostos, pertencem a um tempo onde qualidade era sinônimo de durabilidade. Bolar um produto com um ciclo de vida era algo insano demais, comercialmente, mais que um tiro no pé, era a forca em si.
O tempo é cruel também com as coisas feitas para durar para ”sempre”, máquinas de escrever, livros,
pratas e bronzes, tudo ali tem a marca do tempo, o fosco no outrora brilhante preto da pintura, o desgaste
nos itens de couro, o amarelado e cheiro característico (com todos os ácaros possíveis) em cada livro, mas
mesmo assim, estes foram itens únicos, criados para durarem para sempre, e aqui estão. Com o cuidado
devido, aquela Olivetti ainda bate sua carta, aquele mimeógrafo provavelmente ainda reproduz suas cópias,
se você achar seu estêncil.
No meu bolso, meu Palm comprado ano passado perdeu a calibração na tela de toque, sua frágil película
metalizada sob plástico desaparece sob o atrito da sua própria capa de proteção. Meus telefones celulares
mal completam um ano em condições razoáveis de conservação. O que estamos deixando para as próximas
gerações quando vivemos uma era descartável, mesquinha e interesseira como esta?
A ingenuidade da criança perguntando ao pai por que aquele ”CD” era tão grande, apontando a um velho LP me enche o coração. Como era bom o baixo chiado da agulha contra o disto, e todos aqueles eternos 15 minutos de música que cada lado fornecia? Quantas coisas não se foram junto com ele? O LP ficou famoso pela bandas colocarem no lado A, as músicas comerciais e suas ”preferidas” e no lado B, o experimentalismo, inovações, cover, o que fosse que fugisse a assinatura da música. O quanto não perdemos hoje com as músicas listadas à revelia de um produtor qualquer? Que característica inerente a este espírito também não ficou ali, numa das barracas da praça Benedito Calixto?
Termino a rua e ao olhar para trás, não viro estátua de sal, mas meu coração sente um aperto de uma saudade, saudade de um tempo que não vivi, mas que posso olhar e tocar e ser testemunha de sua passagem pela nossa vida, ou a vida dos meus pais. Contudo o que minha geração estará deixando para a próxima, se iPods ficam amarelos com dias de uso e celulares são mastigados pelo ritmo de lançamentos em questão de meses? A própria feira me parece hoje, estar em extinção...
Benedito Calixto foi famoso artista plástico, nascido em Itanhaém em 1853 e morreu pouco depois da semana de arte moderna de 1922, mais precisamente, em 1927 e seu nome não poderia ter homenagem mais justa que esta feira, maravilhosa para se perder sábado à dentro, bem como nas ruas do entorno da praça.
Quando passeio pela feira, não posso deixar de imaginar ao ver por lá espalhados objetos antigos, que outrora foram sonhos de consumo de nossos pais e avos, o que verão nestas feiras meus filhos e netos. Todos os objetos hoje lá expostos, pertencem a um tempo onde qualidade era sinônimo de durabilidade. Bolar um produto com um ciclo de vida era algo insano demais, comercialmente, mais que um tiro no pé, era a forca em si.
O tempo é cruel também com as coisas feitas para durar para ”sempre”, máquinas de escrever, livros,
pratas e bronzes, tudo ali tem a marca do tempo, o fosco no outrora brilhante preto da pintura, o desgaste
nos itens de couro, o amarelado e cheiro característico (com todos os ácaros possíveis) em cada livro, mas
mesmo assim, estes foram itens únicos, criados para durarem para sempre, e aqui estão. Com o cuidado
devido, aquela Olivetti ainda bate sua carta, aquele mimeógrafo provavelmente ainda reproduz suas cópias,
se você achar seu estêncil.
No meu bolso, meu Palm comprado ano passado perdeu a calibração na tela de toque, sua frágil película
metalizada sob plástico desaparece sob o atrito da sua própria capa de proteção. Meus telefones celulares
mal completam um ano em condições razoáveis de conservação. O que estamos deixando para as próximas
gerações quando vivemos uma era descartável, mesquinha e interesseira como esta?
A ingenuidade da criança perguntando ao pai por que aquele ”CD” era tão grande, apontando a um velho LP me enche o coração. Como era bom o baixo chiado da agulha contra o disto, e todos aqueles eternos 15 minutos de música que cada lado fornecia? Quantas coisas não se foram junto com ele? O LP ficou famoso pela bandas colocarem no lado A, as músicas comerciais e suas ”preferidas” e no lado B, o experimentalismo, inovações, cover, o que fosse que fugisse a assinatura da música. O quanto não perdemos hoje com as músicas listadas à revelia de um produtor qualquer? Que característica inerente a este espírito também não ficou ali, numa das barracas da praça Benedito Calixto?
Termino a rua e ao olhar para trás, não viro estátua de sal, mas meu coração sente um aperto de uma saudade, saudade de um tempo que não vivi, mas que posso olhar e tocar e ser testemunha de sua passagem pela nossa vida, ou a vida dos meus pais. Contudo o que minha geração estará deixando para a próxima, se iPods ficam amarelos com dias de uso e celulares são mastigados pelo ritmo de lançamentos em questão de meses? A própria feira me parece hoje, estar em extinção...
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