Capítulo 17: Aquelas 24 horas perdidas

Estudiosos iriam dedicar anos ao estudo dos ocorridos durante aquelas 24 horas, e ainda assim, quando finalmente os acontecimentos ocorridos durante aquele 29 de dezembro de 2013 da nova realidade, ou como diziam então, 29 de Téntátônix do ano 3, ainda iriam suscitar para todo o sempre centenas de teorias de conspiração e documentários no Discovery Channel e no History Channel, associando os ocorridos com alucinações coletivas, a chegada de alienígenas ou a presença de algum deus monoteísta, que fazem com que, à parte um grupo seleto de crédulos, todos iriam rir-se destas ideias tão tontas.

Seja como for, é um fato consumado, que naquela manhã seguinte, sem saber como chegou lá, ou melhor ainda, achando que tudo que tinha vivido até aqui foi meramente um sonho, Flor de Cactos desperta na manhã seguinte novamente como Flock Shields, em seu quarto, com seu amado rato Flash na gaiola ao seu lado. O cheio de café e torradas na manteiga o despertou, e então ele ouviu as vozes de seus pais no piso debaixo, na cozinha. Ele reclamava algo sobre os custos das passagens de ônibus e ela sobre os preços dos mercados e o aumento da hora da pista de boliche. Flor olhou suas roupas masculinas, e como um sonho, afastou as sapatilhas e vestidos da sua mente, seguiriam sendo um sonho do passado. 

Leah, acordou órfã como estava, na casa que era só sua e de sua tartaruga. Tinha pedido emancipação para ficar com a casa, ainda que seu pais, antes de se matarem, tenham deixado tudo para obras de caridade e instituições de criação de iscas de pesca. Ela se vestiu com seus vestidos preferidos e se preparo para sair ao colégio. Afastando a antiga realidade da mente, ela teria um encontro esta noite, e estava ansiosa por arrumar um marido que a sustentasse, antes que a pensão do estado acabe, o que seria quando ela cumprisse 16 anos. 

No ônibus para o colegial, ela encontrou-se com Berto, seu namorado. Ele estava lá, com uma jaqueta da equipe esportiva do colégio, apesar de fazer um calor que poderia assar um bolo no ônibus tomado de gente. Ambos se sentiam estranhos ali, e como todos viviam olhando para aparelhos pequenos, celulares, era isso. Ambos se lembraram dos seus, quase ao mesmo tempo. 

Ao chegarem no colégio, fingiram que não viram ao Flock, e foram direto para a sala de aula. A aula de economia do Professor Antony Helmans era a pior. Inseguro, deprimente, um triste homem solteiro. O dia transcorreu normal, Berto na roda dos populares, Leah na roda das populares, Flock renegado entre os impopulares. O único incidente foi o cinema de Leah e Berto, prejudicados com uma passeata feminista na avenida que prejudicou um pouco o filme. Não que ambos tenham se dado conta.

Ao final do dia, os três, relativamente tristes, foram para suas casas. O jornal falava algo sobre um novo imposto, Flock olhava os folhetos de cursos universitários. Ele queria fazer moda, mas seus pais queriam que ele fizesse algo útil, como medicina ou direito. Ele suspirava, mesmo sabendo que ainda era alguém muito feliz, o mais feliz possível para alguém preso para sempre na classe média baixa, e sem perspectivas de crescimento ou sem rasgo de genialidade. Antes de dormir por mais um dia que passou diante dele, ele olha para o velhíssimo ratinho em sua gaiola, e diz:

- Se ao menos pudéssemos ser algo diferente, Flash, se houvesse alguma alternativa a essa vida mais ou menos...

Mas tudo que seu rato fez, foi suspirar de forma inaudível, e morrer de velho...

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