Queima São Paulo... Queima...

Naturalmente acontece isso, e acho que é com todo mundo. Você sai de férias e quer conhecer desde os mais belos parques, da cidade onde você está, até os mais escuros becos, para ver se são assim, tão mais perigosos que os da sua cidade. Você fotografa tudo, reporta tudo, e come em todos os lugares e volta para casa, com aquela sensação, sabe, aquela sensação de você nunca conheceu sua própria cidade?

Então eu voltei para São Paulo e num belo final de semana, com o sol calcinando a Terra, num lindo domingo, eu decido, vou a pé à casa dos meus pais! Do metrô Vergueiro ao Tucuruvi. Não pode ser difícil, certo? Descer em linha reta até a Sé, cruzar ou pelo Parque Dom Pedro ou pelo Anhangabaú, e chegar à zona norte, através da Tiradente, Cruzeiro do Sul, Otto Baungarden e Luiz Dummont Villares. Olho no Google, previsão caminhando de 2 horas. Beleza.

Então eu desço a Vergueiro e vou fotografando tudo. Cada prédio, pedestre, cada casa, cada carro. Conhecendo minha cidade, maneiro... E me ocorre um pensamento, e seu pegasse uma dessas bicicletas do Itaú, e fosse de bicicleta, já que a cidade está tomada destas ciclovias aos domingos? O plano ótimo vira pesadelo quando eu finalmente encontro uma das ilhas que alugam a bicicleta: os primeiros 30 minutos grátis, depois 5 reais por cada meia hora. Bicho, se eu for aos meus pais, almoçar e voltar, vamos dizer, umas 4 horas de janela, daria 40 reais! Impossível, mais um pouco e alugo um carro, dane-se a bicicleta.

Sério que as pessoas pagam para usar essas bicicletas laranjas horríveis? Eu não posso acreditar. Desisto da bicicleta. Eles que a coloquem, com a ciclo faixa, os bandeirinhas das ciclo-faixas, e tudo o demais, onde o sol no brilha, e as opções são poucas nesses dias de sol de janeiro paulistano seco.

Caminho até a Sé, e por lá eu também concluo que tirar fotos deixou de ser uma boa ideia. Estou tirando a foto da igreja da Sé, e no mesmo segundo, alguns camaradas sem camisa e sem banho me cercam, perguntam algo, buscam papo e eu busco um policial por perto. Sorte, tem um logo ali e vou até ele. "Como é melhor para ir para a zona norte à pé?", pergunto para ele. E ele me diz "de metrô". E eu falo, "não, à pé mesmo, andando". "De metrô" ele repete como se fosse a primeira vez, parecendo mais o Corvo do Poe falando "nunca mais".

"Olha, eu quero fazer turismo na minha própria cidade, como faço para ir à pé? Anhangabaú ou Dom Pedro, qual é melhor?". "Você quer ser roubado, é?". Foi a resposta do policial. Que desistiu de me mandar ao metrô e ao final me disse que fosse pelo Anhangabaú, mas se eu fosse roubado, era problema meu. Linda cidade. Linda...

Caminho apressado, com medo, olhos estranhos me medem a cada passo, e eu começo a achar que o policial tinha razão, mas marcho. Rápido como Marcha Atlética. Ligeiro como o cramunhão estivesse atrás de mim e chego na casa dos meus pais, suado, amaldiçoando essa cidade, suas estúpidas bicicletas caras, ruas escuras, mendigos perigosos e zumbis do cracke, seus policiais que têm razão, mas não protegem a cidade se sabem onde é perigoso, e odiando São Paulo, por seu aniversário, por sua existência, por suas ruas sujas.

De Santo, a cidade não tem mais nada. Agora é Sodoma e Gomorra. All over again. E as cinzas estão chegando, sob efeito de um sol gigantesco, secando e matando a cidade... É só não olhar para trás.

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