Overthinking: Ensaio sobre a cegueira (só spoilers, não leia se não quiser)

Caos na cidade ou apenas mais uma segunda feira paulistana?

O filme Ensaio sobre a cegueira, de 2008, do livro homônimo de Saramago, foi produzido pela ação conjunta de Japão, Canadá e Brasil, filmado por Fernando Meirelles, produzido em São Paulo e com um elenco norte americano. Hulk Mark Ruffalo é um dos protagonistas, com Julianne Moore como atriz coadjuvante, ainda que ambos se revezem nestes papeis ao longo do filme. Atuam ainda Danny Glover (o sindicalista de 2015!) e Gael Garcia Bernal.

O filme aborda uma tal de epidemia branca, uma cegueira que acomete de um motorista aleatório à todos que tem ou terão contato com ele à partir de então, derrubando a sociedade como um todo, quando todos caem vítimas da doença. O filme é ainda uma constatação do ditado: "em terra de cego, quem tem um olho é rei", quando Julianne Moore se mostra resistente à essa epidemia, sem explicação ou razão.

Milhares são as consequências da cegueira generalizada. Serviços de TV saem do ar, o trânsito vira um caos, os serviços de entrega de mercadorias às lojas são interrompidos, e então as lojas fecham. O desemprego, fome e miséria são avassaladoras e sozinhas já derrubariam qualquer governo, se tivesse sobrado alguém não cego para governar.

Outra consequência da cegueira, é a perda da vaidade. Quem não vê como está, se cuida menos, e logo, passa a cuidar do seu ao redor menos. Sem ter como ver a sujeira, não há problemas de sujeira. E logo, uma cidade cinza, triste, feia e suja como São Paulo é a escolha perfeita, sem gastar um centavo com pós-produção, para representar uma cidade abandonada, suja. Ninguém mora em São Paulo, as pessoas habitam São Paulo. Ninguém olha para a sujeira da cidade, cegos por seus próprios problemas, vendados pelo cuidado desperdiçado na parede pintada, e então pichada, sem punição, sem culpados.

E logo, se ninguém cuida das casas, ninguém cuida das calçadas, e das faixadas. E os prédios ficam mais cinzas, e a poluição, ainda pior sem a chuva para lavá-la, deixam ainda mais cinza a cidade que ninguém olha.

A beleza está nos olhos de quem vê, mas quando ninguém vê, qual beleza está lá? Quando uma árvore cai na floresta, e não tinha ninguém por perto para ouvir, como saber se ela fez barulho? Quando a beleza foi toda coberta de cimento e cinzas, como saber se há beleza ainda?

O filme é exasperante pelas dificuldades vividas pelos personagens. Como filme é perfeito, a obra de Saramago já é em si, brilhante, este eterno (quase literalmente) questionador do capital, das posses e de quem somos, mas a escolha de Fernando Meirelles por São Paulo coroa um filme maravilhoso.

Em tempo, Andres, que dividia o quarto alugado com minha esposa numa pensão, a tal Casa das Mosquitas, atuou nesse filme. Lamentavelmente, não o vimos...

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